As escolas públicas com melhor desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) são as federais e as militares. Também entram neste grupo algumas escolas técnicas estaduais, como a ETESP em São Paulo. O que essas escolas têm em comum é pouco explorado no atual debate sobre o ensino básico (até mesmo porque aqueles que têm mais propriedade sobre o assunto, os professores do ensino básico, são geralmente excluídos do debate). O que essas escolas possuem em comum é o fato de serem autarquias, ou seja, possuem autonomia administrativa. Vamos tentar mostrar aqui que a ausência desta característica na maioria das escolas públicas brasileiras é o principal problema da nossa educação básica.
Certa vez, uma das salas da escola em que lecionávamos tinha
mais de 40 alunos. É comum uma sala com mais de 40 alunos. Mas essa
especificamente era frequentada por uma quantidade enorme de alunos
indisciplinados. Considerando também o enorme desgaste que era trabalhar nesta
turma (para alunos e professores), o resultado foi uma aprendizagem ruim. Era
consenso entre professores, equipe pedagógica, pais e os próprios alunos que o
melhor era dividir a sala. Após uma reunião com os pais, fizemos um pedido à
Secretaria de Educação do Estado para dividir a turma. A resposta foi negativa.
Há escolas autárquicas que, por exemplo, colocam professores
para dar aulas de reforço em contraturno. Essa é uma medida muito eficiente
para a melhoria de desempenho escolar. Muitos alunos com dificuldades usam
essas aulas de reforço para compreender melhor o conteúdo não só como um estudo
a mais mas, também, porque há menos alunos em sala e, assim, o professor pode
se concentrar mais detidamente na dificuldade do aluno. Em reuniões pedagógicas,
sempre cogitamos esse tipo de ação, mas a maioria das escolas públicas não têm
essa competência, pois exige a contratação de mais professores e, às vezes,
remanejamento de turmas etc. Somente as Secretarias de Educação podem fazer
isso.
Até mesmo a maioria das reuniões entre os profissionais da
escola são pautadas pelas Secretarias de Educação. Isso significa que muitas
vezes não podemos discutir questões mais urgentes da escola. Dependendo do
Estado ou cidade, nem mesmo liberar professores para a participação de eventos
acadêmicos é possível. Isso é de extrema importância para a melhoria da
qualidade de ensino. Na prática, a formação continuada oferecida aos
professores são meros encontros pautados pelas Secretarias e são de péssima
qualidade. E sabemos que formação continuada de verdade se faz principalmente
em eventos e cursos acadêmicos.
A quantidade de entraves burocráticos em escolas sem
autonomia administrativa é grande. Esses citados até aqui são suficientes para
dar uma noção do problema. E eles se estendem também à logística e à manutenção
física. Às vezes, um simples reparo não é feito sem o aval da Secretaria de
Educação. O que pode contribuir na precarização da estrutura física da escola.
O grupo das melhores escolas, por serem autarquias, estão
livres de vários desses entraves burocráticos que prejudicam a escola. Em
qualquer boa instituição pública no mundo, o grau de autonomia administrativa é
muito maior que o da maioria das escolas brasileiras. Isso por uma razão
simples: quem melhor sabe o que deve ser feito é quem está no dia a dia da
administração. Mesmo que muitas vezes toma-se medidas equivocadas, as chances
de quem está de fora errar é muito maior. O resultado está aí para todos verem.
A maior parte das escolas públicas do Brasil não são autarquias e são ruins.
Antonio Djalma Braga Junior, filósofo e historiador, doutor em Filosofia
pela UFPR. Atualmente é professor de ensino superior, Diretor do Instituto
Smart CIC e criador do Canal do Djalma (Youtube).
Thiago Melo, filósofo, é professor da Secretaria Estadual de
Educação do Estado do Paraná.